quinta-feira, 2 de março de 2017

A literatura está ao alcance de todos, mas nem todos a alcançam

Quando foi expulsa do útero de sua mãe, Nina sentiu-se completamente desprotegida, solta num mundo que se lhe apresentou hostil e no qual não teria chance alguma de sobreviver sozinha. Até aquele momento guardada no ninho morno e aconchegante, protegida dos ruídos doloridos, da luz ofensiva e do ar frio, agora ela teria, além de enfrentar esses desconfortos, que respirar e se alimentar por conta própria, pois, cortado o cordão umbilical, sua mãe não lhe deixou outra alternativa. Essas foram as primeiras impressões que se gravaram no corpo e no inconsciente de Nina tão logo ela se separou da mãe.

Tomado o primeiro banho, Nina foi levada à mãe, que a conchegou no colo nu e a fez sentir o calor morno dos seios inchados de colostro - e depois de leite. Nina sentiu-se confortável, olhou para cima e viu de maneira embaçada uma imagem. Essa imagem lhe falava em voz doce. Em seu corpo, Nina sentiu o toque agradável das mãos e dos braços maternos. A imagem embaçada do rosto, aquela voz, aquele calor, aquele toque foram das primeiras imagens visuais, sonoras e táteis impressas no corpo e na psique de Nina - e eram imagens boas, afinal, o mundo do lado de fora se tornava menos hostil em face desse acolhimento amoroso e confortável.

Alojada no colo, agora a mãe a leva ao seio. Porém Nina não sabe o que fazer, pois até a pouco se alimentava pelo cordão umbilical. A mãe insiste, besuntando os lábios da filha com o líquido espeço que vaza da mama. Ainda não sabe o que é sabor (imagem gustativa), mas Nina sente um cheiro que, ao se associar com as imagens agradáveis anteriores (o rosto a inspirar segurança, a voz doce, o calor e o toque prazerosos), ganha um sinal de positivo em suas impressões iniciais do mundo.

Espera! Esse cheiro vem desse líquido espesso... Será que é bom?

Depois de várias tentativas, Nina descobre o que fazer: sugar. O líquido entrando pela boca, descendo pelo aparelho digestivo dá um grande prazer. A dor na barriga desaparece, a irritação vai embora e, enquanto suga o colostro, Nina olha para cima e, em pouco tempo, não no mesmo dia, talvez nem nos próximos, vai enxergando mais nitidamente aquele rosto amoroso, aquele olhos doces e associando-os ao imenso prazer de mamar e... cochilar deliciosamente.

Ao longo de sua vida, bilhões de imagens visuais, sonoras, táteis, palatais, olfativas (agradáveis e desagradáveis; prazerosas ou profundamente traumáticas) se imprimirão no corpo e na psique de Nina. Muitas dessas "impressões" físicas e psíquicas ficarão, modo de dizer, à flor da pele, outras serão esquecidas e ficarão depositadas, em estado latente, em seu inconsciente. Às vezes aparecerão em sonhos ou pesadelos, às vezes voltarão à tona ao acaso na forma de lembrança: um cheiro que remete a uma situação perdida no tempo; um pôr-de-sol que a fará recuar anos no passado e experimentar com a mesma intensidade de criança uma sensação associada a uma pessoa amada e, miséria das misérias, perdida para sempre.

A verdade é que Nina enlouqueceria caso se lembrasse de tudo que viveu, ou caso sentisse tudo a que seu corpo e sua emoção foram expostos, sem o amortecimento do tempo. Noutras palavras, sem o recalque de um mundo de sensações e impressões físicas e psicológicas, Nina não se teria convertido em menina, moça e mulher.

Sem entrar em muitos meandros que cabem mais aos psicólogos do que a escritores ou professores de língua e literatura, meu caso, o que importa aqui saber é que Nina, como todos nós, é uma parte consciência, outra parte mistério (inconsciência). Com certeza, a parte maior de nós e dela é a que fica encoberta, recalcada, trancada nos porões ou sótãos da nossa psicologia - e dela .

Gosto de empregar a alegoria do poço: nosso inconsciente é um poço cego, profundíssimo, escuro, mas cheio de água - doce ou podre, potável ou infecciosa, clara ou cheia de lodo, plácida ou tormentosa.

Ao longo da vida, nossas experiências convertidas de imagens em sensações (de dor ou prazer, gozo ou frustração, euforia ou medo, entre milhões de outras) escorrem pelas fendas do chão duro da nossa consciência e vão se depositar nos "lençóis freáticos" do nosso inconsciente, de que desconhecemos a profundidade e extensão.

Ao abrir um poço para trazer de volta à tona um pouco dessa água, fizemos uma parte do que é possível para resgatar uma mísera fração de tudo que vivemos e que ficou impresso em nossa própria profundeza.

Porém abrir esse poço é só metade do trabalho: é preciso ter às mãos ao menos  uma corda e um balde, para, com a frequência necessária à nossa sanidade, atirá-lo ao fundo e com ele puxar um tanto dessa água clara ou turva, límpida ou poluída, potável ou venenosa.

Esse poço, essa corda e esse balde, são a linguagem verbal.

É por meio dela que temos a possibilidade de tornar consciente, por meio da conversão de imagens e símbolos em palavras, aquilo que, escorrendo pelas fendas de nossa consciência ao longo dos anos, foi se depositando no fundo desse poço cego que é o nosso inconsciente.

Se não desenvolvemos essa habilidade de ir ao poço do nosso inconsciente munidos ao menos dessa corda e desse balde, manifestações desse inconsciente um belo dia saltarão acidentalmente pelas mesmas fendas de nossa psicologia pelas quais desceram na forma de pesadelos - quando dormimos - ou na forma de sintomas (mal-estar aparentemente sem origem, angústia, depressão - ou mesmos sintomas físicos ou psíquicos compulsivos, que requererão auxílio de profissional especializado).

E onde é que a literatura entre nessa conversa?

A literatura (ficção ou poesia), linguagem em potência máxima, é por excelência o kit perfeito para furar poços, com corda, balde e sarilho junto. Não é à toa que o pai da psicanálise, Sigmund Freud, foi buscar na literatura clássica grega os modelos para o desenvolvimento de sua ciência.

A literatura é um grande laboratório da vida. Todas as possibilidade individuas e coletivas, psicológicas e sociais, íntimas e históricas têm nela livre curso. Nossos medos e fantasmas, nossa coragem e covardia, nossa capacidade para a generosidade ou para a monstruosidade, para o amor e o ódio, a lealdade ou a traição, nossa feiura e nossa beleza, nossos sonhos e nossos pesadelos estão nela esperando por nós ou esperando que soltemos ou projetemos nela nossos anjos e demônios.

Não é preciso se expor à violência para se experimentar todo seu potencial de destruição: há poemas, peças teatrais, romances, contos que nos fornecem farto material para sentirmos e refletirmos sobre ela.

Ainda que por uma razão absolutamente prática, a literatura permite que o indivíduo antecipe consequências de situações na vida real similares àquelas representadas literariamente. Não é preciso se envolver com pessoas cruéis para se saber do que elas são capazes: a literatura universal está repleta de personagens cujas características foram extraídas de pessoas existidas, existentes e possíveis de virem a existir no futuro.

A literatura está repleta de maníacos, de gente sórdida, repulsiva, interesseira, abjeta, capaz de tudo, inclusive de impor os piores sofrimentos a outras pessoas, para atingirem seus objetivos ou simplesmente para obter prazer. Seria ótimo se essas representações não tivessem referência na vida real. Mas já que têm, sempre é bom conhecê-las por meio dos experimentos que a literatura oferece - até porque o monstro pode ser a gente mesmo.

Do mesmo modo, a literatura universal transborda de personagens os mais generosos, corajosos, lutadores, solidários, éticos, bonitos moralmente (e o Corcunda de Notre Dame não é exemplo solitário de feio-lindo) - e também os conflituosos, meio médicos, meio monstros.

Ao nos habilitar em converter imagens e símbolos em palavras e vice-versa, a literatura nos entrega de bandeja os instrumentos para que penetremos nos estágios mais profundos de nossa condição humana e de nossos próprios inconscientes de indivíduos.

Assim fica explicado por que tantos dizem não gostar de literatura: não conseguem converter imagens e símbolos em palavras, e muito menos o processo inverso: converter palavras em imagens e símbolos, que por sua vez se relacionam complexamente com sensações, sentimentos, lembranças, ideias e conceitos. Ou seja, não conseguem mobilizar seu infinito repertório de imagens simbólicas (visuais, auditivas, táteis, palatais, olfativas) acumulado em si mesmos ao longo dos anos. Estão sem poço, sem corda e sem balde para puxar a água de suas próprias profundezas.

Como ninguém gosta de sofrer, ao não se extrair das palavras nada que dê prazer, é comum a rejeição à literatura sob o argumento: "não gosto", que na verdade quer dizer "não consigo": não consigo converter palavras em imagens visuais, auditivas, palatais, olfativas, táteis, conceituais... - e, por conseguinte, "não consigo sentir  nada".

Porém, ao rejeitar a literatura, ainda que por uma culpa que só não lhe cabe em parte, o indivíduo estará a léguas da humanidade e de si mesmo - e a compreensão que terá dela e de si será sempre, na melhor das hipóteses, infantil e rasa.

Nina é  nome que eu inventei para simbolizar todas as pessoas que, por meio da leitura literária, descobriram o prazer em jogar o balde bem fundo dentro de si e puxar desse fundo sem fundo um tanto de mundo e outro tanto de si. A literatura é sua terapeuta, seu laboratório de vida e sonhos. Por meio dela elas podem viajar a mundos passados, contemporâneos e futuros, e também imaginar e sentir o delicioso conforto do seio, do leite e mesmo do útero materno per omnia saeculum seculorum.

Jeosafá, professor, pesquisador colaborador do Depto. de História da USP, foi da equipe do 1o, ENEM, em 1998, e membro da banca de redação desse Exame em anos posteriores. Compôs também bancas de correção das redações da FUVEST nas décadas de 1990 e 2000. Foi consultor da Fundação Carlos Vanzolini da USP, na área de Currículo e nos programas Apoio ao Saber e Leituras do Professor da Secretaria de Educação de São Paulo. É escritor e professor Doutor em Letras pela Universidade de São Paulo. Autor de mais de 50 títulos por diversas editoras, lançou em 2013 O jovem Mandela (Editora Nova Alexandria);  em maio de 2015, nos 90 anos de Malcolm X, O jovem Malcolm X, pela mesma editora; no mesmo ano publicou A lenda do belo Pecopin da bela Bauldour, tradução do francês e adaptação para HQ do clássico de Victor Hugo, pela editora Mercuryo Jovem. Leciona atualmente para a Educação Básica e para o Ensino Superior privados.


terça-feira, 21 de fevereiro de 2017

SINTAGMA: CINCO TIPOS


Embora seja área de muito debate, divergência e estudos e pesquisas ainda em curso, os linguistas identificam, de acordo com o respectivo núcleo, 5 tipos sintagmas em língua portuguesa:
  1. verbais; 
  2. nominais;
  3. adjetivais;
  4. adverbiais;
  5. preposicionais.

1. Sintagma verbal
O singma verbal é uma combinação de termos que tem como eixo estruturante um verbo transitivo direto, indireto, ou intransitvo, pois nesse caso o verbo exerce função principal, ao abrigar a informação principal do enunciado:

A prática da escrita desenvolve a reflexão crítica.
                                                                           VTD             OD

Observe que a parte grifada na oração acima é um sintagma verbal, que é sinônimo de predicado verbal), pois tem em seu núcleo (em negrito) um verbo transitivo direto (VTD, que precisa de um complemento, senão fica sem sentido: desenvolve o quê? A resposta é um objeto direto, OD).

O núcleo do sintagma verbal pode ser também um verbo transitivo indireto (que precisa de um complemento, mas que vem regido por uma preposição). Vamos usar o mesmo exemplo acima, pois o verbo desenvolver pode ser também transitivo indireto, ou seja, é um verbo bitransitivo (verbo transitivo direto e indireto, VTDI), pois pode ter um objeto direto e outro indireto (OI) como complemento:

desenvolve em nós a reflexão crítica.
                                                    VTDI               OI                OD
Desenvolve em quem (VTI)? Em nós (OI). Desenvolve o quê (VTD)? A reflexão crítica (OD).

O núcleo do sintagma verbal (ou do predicado verbal) pode ser um verbo intransitivo (VI), ou seja, que não necessita obrigatoriamente de um complemento por ter um sentido completo:

O carro da pamonha chegou mais cedo!

Embora o verbo chegar esteja acompanhado das palavras combinadas "mais cedo", ele não perde o sentido se essas palavras forem simplesmente omitida: "O carro da pamonha chegou"; diferente da oração anterior, na qual a omissão do complemento verbal causa perda de sentido: "A escrita desenvolve" (Desenvolve o quê, em quem?).

Com a expressão "mais cedo" não é essencial, mas acessória, não complementa, mas suplementa o sentido, dizemos que é um adjunto adverbial (no caso, de tempo: cedo).

2. Sintagma nominal

O sintagma nominal é uma combinação que tem como núcleo (em negrito) um substantivo.

Ele pode compor o sujeito:

prática da escrita desenvolve em nós a reflexão crítica.
carro da pamonha chegou mais cedo!

Mas também fazer parte do predicado de diversas formas (núcleo sempre em negrito).

Sintagma nominal como objeto direto:

A prática da escrita desenvolve em nós reflexão crítica.

Compondo o aposto (um tipo de expressão explicativa introduzida na oração entre vírgulas):

A prática da escrita, particularmente a dissertação agumentativa, em nós a reflexão crítica

Compondo o vocativo (expressão que chama a atenção):

Atenção minha gente, a prática da escrita desenvolve em nós a reflexão crítica.

Assim, não importa onde esteja, se é uma combinação de palavras com um substantivo como núcleo, é um sintagma nominal.

3. Sintagma adjetival ou adjetivo

O sintagma adjetival ou adjetico tem no núcleo um adjetivo, portanto, ele ocorre nas mesmas funções típicas do ajetivo:

Adjunto adnominal:
A escrita muito apressada resulta em erros às vezes bastante graves.
(observe aqui que o primeiro ajunto adnominal está ligado ao núcleo do sujeito: "escrita"; o segundo, ao objeto direto: "erros".

Predicativo do sujeito (quanto temos uma orção formada por verbos de ligação (ser, estar, ter, haver, parece, ficar, permancer, continuar etc., que expressam qualidade), que dão origem ao predicado nominal, pois o núcleo dele não é o vermo mas o adjetivo: 

 A prática da escrita parece ótima.
 A escrita ficou ótima.
 A escrita continua ótima.
Aposto:

A prática da escrita, sempre saudável, parece ótima.

4. Sintagma adverbial

O sintagma adverbial tem no núcleo um advérbio (palavras invariáveis que expressam tempo, lugar, modo, circunstância, companhia, intensidade etc.) e constituiem os adjuntos averbiais:

A redação foi escrita muito apressadamente.
(aqui, dois advérbios, muito e apressadamente, compõe o adjunto adverbial de modo)

Porém pode ocorrer de um único advérbio constituir sintagma adverbial:

A redação foi escrita apressadamente


5. Sintagma preposicinal ou preposicionado

São todos aqueles que são introduzidos por uma preposição:

Adjunto adnominal preposicionado:
Quando a expressão tem função de adjetivo:

A ortografia da língua portuguesa do Brasil...
(do Brasil = brasileira)

Adjunto adverbial
Quando a expressão tem fução de advérbio:

A ortografia da língua portuguesa nBrasil...
(no Brasil = advérbio de lugar)

Complemento nominal:
Quando a expressão complementa o significado de um termo nominal que a precede. Por exemplo: substantivo: pé-de-moleque; adjetivo: verde de raiva; advérbio: muito de repente.

A ortografia da língua portuguesa no Brasil...
(da língua complementa o sentido de "ortografia", que é um substantivo)

Agente da voz passiva:

A escrita fui muito desenvolvida pelos romanos.

O sintagma é um processo de combinação estruturante da língua. Combina palavra a palavra dando origem a fragmentos de expressões, que por sua vez, ao se combinarem, compõem os termos de uma oração (sujeito, predicado e termos que os constituem, tais como adjuntos nominais e adverbais, complementos verbais e nominais etc.).

Porém isso se dá também em nível mais complexos, nos perídos compostos por coordenação e subordinação, pois um advébio, por exemplo, pode aparecer de maneira simples, numa só palavra, mas pode ser expresso na forma de uma oração inteira:

Os jovens saíram agora do shopping.
(Adjunto advérbial de tempo: agora)
Os jovens saíram do shopping quando terminaram o lanche.
(Oração subordinada adverbial temporal: quando terminaram o lanche).

Essa oração quando terminaram o lanche está subordinada ao verbo sair, e a palavra que indica tempo nela é a conjunção subordinativa quando. Assim, essa oração é um sintagma adverbial, e a função dessa conjunção é parecida com a da preposição: subordinar a palavra ou combinação de palvras a um termo específico (aqui, no caso, o verbo sair).

Porém, esse é assunto para próximas aulas. Não se esqueçam de tirar dúvidas na área de comentários e...
Amplexos do Jeosafá a tod@s!
LEIA TAMBÉM:

SINTAGMA: A ARTE DE COMBINAR



Jeosafá, professor, foi da equipe do 1o, ENEM, em 1998, e membro da banca de redação desse Exame em anos posteriores. Compôs também bancas de correção das redações da FUVEST nas décadas de 1990 e 2000. Foi consultor da Fundação Carlos Vanzolini da USP, na área de Currículo e nos programas Apoio ao Saber e Leituras do Professor da Secretaria de Educação de São Paulo. É escritor e professor Doutor em Letras pela Universidade de São Paulo. Autor de mais de 50 títulos por diversas editoras, lançou em 2013 O jovem Mandela (Editora Nova Alexandria);  em maio de 2015, nos 90 anos de Malcolm X, O jovem Malcolm X, pela mesma editora; no mesmo ano publicou A lenda do belo Pecopin da bela Bauldour, tradução do francês e adaptação para HQ do clássico de Victor Hugo, pela editora Mercuryo Jovem. Leciona atualmente para a Educação Básica e para o Ensino Superior privados.




segunda-feira, 20 de fevereiro de 2017

SINTAGMA: A ARTE DE COMBINAR

Na língua como na natureza, unidades mínimas se juntam para dar origem a unidades maiores. Assim como átomos se unem para dar origens a moléculas, e estas se juntam a outras para dar origem a substâncias simples ou complexas, na língua sons elementares (os fonemas) representados por escrito pelas letras, se juntam para dar origem a fragmentos (prefixos, sufixos, radicais, vogais temáticas, desinências) que, por sua vez, se unem e dão origem a palavras:

Prefixo
Prefixo
Radical
Vogal Temática
Desinência verbal formadora de
des
in
form
a
r
Infinitivo




nte
Particípio presente ou adjetivo




do
Particípio passado ou adjetivo




ndo
Gerúndio ou adjetivo

Prefixo
Radical
Vogal Temática
Sufixo formador de
in
form
a
ção
Substantivo



l
Adjetivo



(l) mente
Advérbio


A mesma lógica que opera no "micro", opera no "macro". Assim, na natureza como na língua, unidades menos complexas podem se juntar a outras unidades menos complexas de outras naturezas para dar origem a unidades de maior complexidade. Dois átomos de Hidrogênio, em processos que duraram bilhões de anos, se uniram a um de Oxigênio dando origem à água (H2O), substância simples que é base de toda a vida conhecida em nosso planeta.

Por sua vez a água se mistura em milhões de combinações, dando origem a formas de vida das mais simples às mais maravilhosamente complexas, como as de plantas e animais, entre os quais a espécie humana.

Na língua ocorre o mesmo. Fragmentos significativos se unem e dão origem a palavras, que se combinam e dão origem a sintagmas (pedaços de frases ou orações). Os sintagmas se combinam e dão origem a orações e períodos, que se combinam e dão origem (na escrita) aos parágrafos, que se combinam e dão origem aos capítulos, que se combinam e dão origem a romances, teses, monografias etc.

Assim, resumindo, sintagma é uma combinação linguística que dá origem a uma unidade em língua oral ou escrita com sentido (se não tem sentido, não é sintagma, pois ele é sempre e necessariamente uma combinação válida). Observe a frase-exemplo:

A escrita apressada resulta quase sempre em erros de ortografia ou sintaxe.

Nela há duas grandes combinações válidas: uma em torno do núcleo do sujeito (um substantivo; escrita), outra em torno do núcleo do predicado (um verbo: resulta).

escrita

resulta
A
apressada

em
quase sempre



erros




de




ortografia
ou
sintaxe


A própria palavra "combinação" já dá a dica para a gente: com-bin-a-ção, ou seja, ação de associar binariamente qualquer coisa que se imaginar, ou seja, em pares:

SINTAGMA NOMINAL
(porque seu núcleo é um nome/substantivo)
OU SUJEITO
 {(A)+[escrita]+(apressada)} 

SINTAGMA VERBAL
(porque seu núcleo é um verbo)
OU PREDICADO VERBAL
{[resulta] + [(em+erro)+(de+ortografia)+(ou+sintaxe)+(quase+sempre)]}

As associações, assim, são sempre binárias, em que um elemento se combina com outro, dá origem a uma unidade maior, que por sua vez se combina com outra menor ou do mesmo nível, e dá origem a uma unidade superior em sentido e complexidade. Podemos acrescentar quantos sintagmas quisermos à oração acima composta de dois sintagmas (sujeito e predicado, ou sintagmas nominal e verbal respectivamente), porém, observe que o núcleo de ambos sempre será o mesmo:

A escrita apressada, descuidada, desatenta resulta quase sempre em erros de ortografia, acentuação, pontuação ou sintaxe:

escrita

resulta
A
apressada

em
quase sempre

descuidada

erros

desatenta


de




ortografia
ou
sintaxe



acentuação





pontuação



Observe que a concordância com a palavra escrita é feita uma a uma (escrita apressada; escrita descuidada; escrita desatenta), sempre binariamente. Do mesmo modo, observe que as palavras acentuação e pontuação (assim como ortografia e sintaxe) estão subordinadas (por meio da preposição de) à palavas erro (erro de ortografia, erro de acentuação, erro de pontuação, erro de sintaxe). A palavra erro, assim, é núcleo de um sintagma (combinação) nominal (porque "erro" é um substantivo/nome), subordinado ao núcleo do predicado (o verbo resulta) pela preposição em.

Muitas combinações na língua são feitas diretamente. Por exemplo, no sujeito da oração acima, as palavras A (artigo feminino singular) e apressada (adjetivo feminino singular) se ligam à escrita diretamente. São adjuntos adnominais, ligados ao substantivo feminino singular escrita sem nenhuma palavra intermediária: essas palavras estão justapostas, postas imediatamente ao lado, junto (daí "adjunto") do substantivo que especificam e qualificam.

Porém, há outro tipo de combinação na língua, quando há a necessidade de um termo intermediário que indique subordinação de uma palavra a outra ou de um sintagma a outro. Nesse caso, temos uma ligação indireta, que implica em subordinação de um termo a outro. Nesse tipo de ligação por subordinação, temos uma palavra (ou sintagma) "regente" e outra "regida". Assim, em resulta em erro, "resulta" é o termo regente (porque é a informação mais importante desse sintagma) e "erro" é o termo regido (pois é uma informação secundária, subordinada pela preposição em). O mesmo ocorre no sintagma erros de ortografia (e nos demais: de acentuação, de pontuação, de sintaxe): "erros" é o regente e "ortografia" é o termo regido (pela preposição de) do sintagma.

Faça perguntas na área de comentários. Lá elas serão respondidas e servirão a outros amigos podem dar origem a novos artigos, ok?

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SINTAGMA: CINCO TIPOS


Amplexos do Jeosafá e até a próxima aula.


Jeosafá, professor, foi da equipe do 1o, ENEM, em 1998, e membro da banca de redação desse Exame em anos posteriores. Compôs também bancas de correção das redações da FUVEST nas décadas de 1990 e 2000. Foi consultor da Fundação Carlos Vanzolini da USP, na área de Currículo e nos programas Apoio ao Saber e Leituras do Professor da Secretaria de Educação de São Paulo. É escritor e professor Doutor em Letras pela Universidade de São Paulo. Autor de mais de 50 títulos por diversas editoras, lançou em 2013 O jovem Mandela (Editora Nova Alexandria);  em maio de 2015, nos 90 anos de Malcolm X, O jovem Malcolm X, pela mesma editora; no mesmo ano publicou A lenda do belo Pecopin da bela Bauldour, tradução do francês e adaptação para HQ do clássico de Victor Hugo, pela editora Mercuryo Jovem. Leciona atualmente para a Educação Básica e para o Ensino Superior privados.