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Psiquiatra Nise da Silveira, que nos ensinou a mergulhar no poço cego de nossas emoções para transformá-las em linguagem. |
Abrindo rodas de conversa sobre seus medos, pesadelos, inseguranças, conflitos pessoais etc., decidimos atacar furiosamente as páginas de nossos cadernos (sim, pois quem entra na roda tem que sambar) para desenhar esses pavorosos fantasmas que nos atormentam e dos quais temos mais medo do que o conde Drácula de uma estaca de pau.
Até os comportamentos se ajustarem à ideia de compartilhamento da intimidade por meio da conversa, deu um certo trabalho, pois certas regras de privacidade e civilidade são essenciais, mas em tempo bastante curto todos já queriam pôr para fora seus fantasmas, empregando linguagem a mais significativa e analítica possível.
A partir das conversas, todos produziriam desenhos e os comentariam na roda de conversa. Desenhos e mais desenhos apareceram, explicados em grande círculo ou em pequenas rodas por quem os viu e por quem os fez – que muitas vezes não percebe o alcance dos símbolos que empregou para representar ora sonhos e pesadelos, ora lembranças angustiantes, ora simplesmente medo de fracassar.
(E aqui abro parênteses. Eesse medo surgiu muito forte, o fracasso do pessoal – o que é uma carga bastante pesada e precoce para adolescentes suportarem, reflexo da instabilidade que o Brasil e o Mundo têm vivido. Fecho parênteses).
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O grito (1893). Edvar Munch. |
Observei que grande parte da bagunça, da indisciplina, das provocações e
conflitos entre os adolescentes nascem da insegurança em relação ao futuro, o
que os deixa instáveis e explosivos.
O que nós adultos estamos prometendo a eles mesmo?
A julgar pelos desenhos, o fim do mundo, o Apocalipse. Isso não é justo! Até porque é mentira, o mundo vai continuar, a despeito de parte das atuais gerações adultas preferirem o ódio, o preconceito e a violência.
Alguns rejeitam a aula com pressa de se haverem logo com os problemas adultos que os angustiam fora de hora: o mercado de trabalho, a faculdade, a sobrevivência família. Porém, como a idade ainda não permite que eles encarem esses ossos duros, eles se angustiam e introjetam problemas cujas soluções ainda não lhes dizem respeito.
Sem ter como interferir nessa carga que indevidamente as gerações adultas atuais jogam sobre seus ombros, e sem ter como e com que se expressar, explodem na sala de aula atirando estojos, trocando empurrões e às vezes socos com os colegas, “infernizando” a vida do professor ou dos pais, ou simplesmente dormindo sobre a carteira, desistindo das lições de casa, enterrando-se no celular em busca de bonequinhos que os façam sorrir – ou acordando de madrugada aos prantos.
É preciso ensiná-los a expressar seus medos e sonhos, a devolver aos adultos a carga indevida, e acenar a eles a possibilidade de um mundo melhor, pois não é justo que as gerações adultas atuais consintam em entregar a seus filhos e netos, e antes do tempo!, um mundo pior do que encontraram. Precisamos agir imediatamente e tirar esse peso das costas de crianças, adolescentes e jovens.
E se os alunos pedirem que a conversa e produção de imagens de seus medos continuem? Como ficará a apostila do bimestre?
Como os gregos e romanos que tinham o Destino acima dos demais deuses, sugiro entregar a ele esse mister, esse enigma crucial para a educação estrangulada pela lógica do consumo.

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