segunda-feira, 12 de abril de 2010

Antologia Poética, de Patativa do Assaré


Org. Gilmar de Carvalho

A obra de Patativa do Assaré, edição após edição, vê as barreiras do preconceito caírem e seu público aumentar por todos os cantos do país. A linguagem moldada pela sonoridade, pela visão de mundo, pelo modo de vida – e pela viola – nordestinos, seus poemas retratam a labuta, os sentimentos e a índole dos que enfrentam os infortúnios da seca e da miséria numa região em que a violência e a injustiça social andam de mãos dadas.

Seus textos ficaram conhecidos pelo público mais amplo primeiramente na voz e na sanfona de Luiz Gonzaga, o Luiz do Baião. Composições como “Triste Partida” – rodou muito tempo pelas rádios e forrós do país e hoje, em um belo vídeo de animação, circula na televisão, nos DVDs particulares e na internet:

“Nós vamo a São Paulo
que a coisa tá feia.
Por terras aleia
nós vamo vagá.
Se o nosso destino
não fô tão mesquinho
Pro mermo cantinho
Nós torna a vortá.”

Esta Antologia Poética de Patativa do Assaré, que conta com um breve mas elucidativo estudo sobre a obra do poeta, reúne poemas na seguinte organização: "Inspiração nordestina", "Novos poemas comentados", "Cante lá que eu canto cá", "Ispinho e fulô", "Balceiro", "Cordéis", "Aqui tem coisa" e "Balceiro 2".

Com isso, o organizador Gilmar de Carvalho pretendeu oferecer ao leitor uma amostra representativa da obra desse importante poeta brasileiro que, revolvendo a terra como agricultor e animando bailes ao som da viola, fez o verso sertanejo, brotado da terra e da alegria popular, ganhar reconhecimento sob a forma impressa, muitas vezes reservada apenas a formas mais eruditas, urbanas ou elitizadas.

Abrir esta Antologia, cujos poemas são irmãos do cordel e do repente, e lê-la coletivamente em voz alta devolve vida a um texto que não nasceu para ficar preso na página feito passarinho em gaiola. Fica aqui esta sugestão.

FONTE: Patativa do Assaré. Org. e Pref. Gilmar de Carvalho. 7 ed. Fortaleza, Ed. Demócrito Rocha, 2008.

Antologia Poética, de Manuel Bandeira

Antologia Poética é uma reconhecida obra de Manuel Bandeira. Organizada pelo próprio autor em 1961, reúne, a seu critério, poemas representativos dos livros: A Cinza das Horas, Carnaval, O Ritmo Dissoluto, Libertinagem, Estrela da Manhã, Lira dos Cinquent'anos, Belo Belo, Opus 10, Estrela da Tarde, Poemas Traduzidos e Mafuá do Malungo.

Poeta de cultura erudita, tradutor de inúmeras obras para o português e crítico de arte, Bandeira foi acolhendo em sua linguagem poética uma simplicidade tão meticulosamente estudada que seus poemas falam com igual impacto a públicos diversos.

Seja o leitor iniciante, seja o leitor experimentado, ambos encantam-se com seus poemas; quer o leitor ocasional, quer o leitor contumaz de suas obras, ambos se comovem com seus inesperados arranjos poéticos que, sob a aparência de brincadeira, destilam a crítica, como no poema “Os sapos”:

“Enfunando os papos,
Saem da penumbra,
Aos pulos, os sapos.
A luz os deslumbra.
Em ronco que aterra,
Berra o sapo-boi:
- “Meu pai foi à guerra!”
- “Não foi! – “Foi!” – Não foi!”
;

Seu lirismo veste-se de inocência com feitio melancólico e pleno de ambiguidades, como no outro poema “Porquinho-da-índia”:

“Quando eu tinha seis anos
Ganhei um porquinho-da-índia.
Que dor de coração me dava
Porque o bichinho só queria estar debaixo do fogão!

Levava ele pra sala
Pra os lugares mais bonitos, mais limpinhos,
Ele não gostava:
Queria era estar debaixo do fogão.
Não fazia caso nenhum das minhas ternurinhas...

- O meu porquinho-da-índia foi a minha primeira namorada.”

A linguagem direta e simples empregada pelo poeta não deve iludir o leitor quanto à natureza enigmática de seus poemas. A voz do sapo, no primeiro, é uma crítica ácida cujo endereço cabe ao leitor desvelar, tanto quanto não é, no segundo, despretensiosa a observação do verso final – ilustrativa de uma sensação de frustração que se estende no tempo.

Descobrir o que há por sob a linguagem aparentemente franca de Manuel Bandeira é um exercício prazeroso, uma vez que essa “franqueza” dá “dicas” de muitas ambiguidades que, exploradas, revelam surpreendentes sentidos subjacentes.

É lógico que esse exercício fica mais rico se o leitor mais experiente recorrer à fortuna crítica da obra do poeta, porém, não há dúvida que os dois poemas em destaque, por exemplo, poderiam ser oferecidos a uma criança que, estimulada por perguntas bem feitas, teria muito a dizer sobre esses “sapos” e sobre esse bichinho de estimação que não dá bola a quem tanto o ama...

FONTE: Bandeira, Manuel. Antologia Poética. 12 ed. Rio de Janeiro, Ed. Nova Fronteira, 2001.

Antologia Poética, de Carlos Drummond de Andrade

Esta Antologia Poética de Carlos Drummond de Andrade, organizada pelo próprio autor em 1962, reúne poemas representativos de sua produção à época da publicação.

Os critérios empregados por ele dividem a Antologia em 9 partes: 1) O indivíduo: “Um eu todo retorcido”; 2) A terra natal: “Uma província: esta”; 3) A família: “A família que me dei”; 4) Amigos: “Cantar de Amigos”; 5) O choque social: “Na praça de convites”; 6) O conhecimento amoroso: “Amar-Amaro”; 7) A própria poesia: “Poesia contemplada”; 8) Exercícios lúdicos: “Uma, duas argolinhas” e 9) Uma visão, ou tentativa de, da existência: “Tentativa de exploração e de interpretação do estar-no-mundo”.

A essas subdivisões agregou-se ainda um Suplemento que, a partir da 5ª. edição, reúne poemas extraídos do livro Boitempo. O volume conta ainda, ao final, com uma “Cronologia” da obra de Drummond, com uma “Biografia” e com um “Índice de títulos de primeiros versos”, o que facilita a consulta dos poemas.

Os temas que preocuparam Drummond até a data de organização dessa reunião de poemas estão nela representados, e o que é mais importante, sob a ótica do próprio autor, a partir de poemas por ele mesmo selecionados.

Ler a poesia de Carlos Drummond de Andrade é mergulhar nos dramas vividos pelo homem ligado a seu mundo e a seu século por profundos laços intelectuais e afetivos.

Do indivíduo que, acometido de estranha sensação, deseja no poema “A mão suja” amputar a própria mão:

“Minha mão está suja.
Preciso cortá-la.
Não adianta lavar.
A água está podre.
Nem ensaboar.
O sabão é ruim.
A mão está suja,
Suja há muitos anos”
;

ao cidadão do mundo que, tocado pela necessidade de intervir na realidade, estende a mão em gesto fraterno:

“Estou preso à vida e olho meus companheiros.
Estão taciturnos mas nutrem grandes esperanças.
Entre eles, considero a enorme realidade.
O presente é tão grande, não nos afastemos.
Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas.”
;

Drummond viaja da geografia sentimental de uma Itabira como que suspensa no tempo, em “Cidadezinha qualquer”:

“Um homem vai devagar.
Um cachorro vai devagar.
Um burro vai devagar.
Devagar... as janelas olham.

Eta vida besta, meu Deus.”;


à geografia de um mundo e de um tempo dilacerados pela guerra, em “Nosso tempo”:

“Este é um tempo de partido
Tempo de homens partidos.

Em vão percorremos volumes,
Viajamos e nos colorimos.
A hora pressentida esmigalha-se em pó na rua.”


Os poemas desta antologia pulsam o tempo inteiro, num movimento que vai dos cantos mais recônditos do indivíduo aos cenários sociais mais inóspitos e propícios ao esmagamento da individualidade; da mais remota e acolhedora Itabira ao mais tumultuado “Mundo mundo vasto mundo”, no qual o poeta se acha e se atordoa, sem se chamar Raimundo e sem solução para os dilemas, poéticos ou não.

Uma excelente atividade de leitura e estudo seria reunir os livros dos quais os textos foram retirados e observar cada poema à luz do contexto original. Que sentidos não ganharia o poema “Elegia 1938”, por exemplo, observado no conjunto do livro de Sentimento do Mundo, do qual foi extraído?]

E no contexto da Antologia, que sentidos assume esse poema, considerados aquele que o antecede e aquele que o sucede imediatamente?

FONTE: Andrade, Carlo Drummond de. Antologia Poética. 64 ed. Rio de Janeiro, Ed. Record, 2009.