segunda-feira, 12 de abril de 2010

Antologia Poética, de Vinicius de Moraes

A poesia profundamente sensível e humanista de Vinicius de Moraes encontra-se representada com dignidade nesta edição de bolso que chega às mãos do leitor com uma bonita foto do autor na capa e com páginas em papel Pólen.

Esta Antologia Poética de Vinicius de Moraes em formato de bolso se baseia na mesma publicada também pela mesma editora em 1990, a qual deriva da seleção realizada pelo próprio autor em 1967 para a editora Jose Olympio. Reúne um amplo panorama da produção do poeta até a data.

Os poemas podem ser lidos em ordem aleatória, sem qualquer contraindicação, porém, se o leitor optar pela leitura linear, observará – uma vez que a organização da obra é cronológica – não uma evolução linear e harmônica no tempo, mas uma trajetória fortemente marcada por dramas individuais e coletivos que, ao afetar a sensibilidade do poeta, implicaram em radical ruptura, com significativas alterações nos planos temático e de linguagem.

Ao longo dessa obra, o poeta se vai desprendendo de um idealismo inicial (em que a morte, a culpa, a dor individual ocupam o centro ideológico dos poemas, elaborados no tecido de uma linguagem soturna e algo complexa) até atingir, ao final da obra, em linguagem direta e clara, a temática social e participante.

Coerente com a “Advertência” que faz a título de prefácio, o autor organizou a coletânea de forma a que o leitor observe sua luta com e pela linguagem, concomitantemente com sua luta em busca de compreender melhor o indivíduo e seus conflitos e o mundo dividido em classes – e suas guerras.

Embora o autor demonstre clara preferência pela produção mais recente, o leitor não se deve deixar iludir com as palavras dessa “Advertência”, pois se o autor desprezasse de fato os poemas reunidos no que chama de primeira parte, simplesmente não os teria publicado na Antologia.

Em que pese a evidente mudança de perspectiva entre os poemas da primeira e os da segunda parte dessa obra, o lirismo, a sensibilidade, o humanismo, a experiência filtrada pela subjetividade, o trabalho refinado com as palavras, verdadeiro virtuosismo de linguagem, são observáveis em ambos.

A título de ilustração, vejamos dois trechos de poemas, um da primeira parte:

“Tende piedade delas, Senhor, que dentro delas
A vida fere mais fundo e mais fecundo
E o sexo está nelas, e o mundo está nelas
E a loucura reside neste mundo.

Tende piedade, Senhor, das santas mulheres
Dos meninos velhos, dos homens humilhados – sede enfim
Piedoso com todos, que tudo merece piedade
E se piedade vos sobrar, Senhor, tende piedade de mim!”
(“Elegia desesperada”)

E outro da segunda parte da obra:

“Contem-lhe, bem em segredo, que eu devo estar prestes, que meus
Ombros não se devem curvar,que meus olhos não se devem
Deixar intimidar, que eu levo nas costas a desgraça dos homens
E não é o momento de parar agora; digam-lhe, no entanto
Que sofro muito, mas não posso mostrar meu sofrimento
Aos homens perplexos; digam-lhe que me foi dada
A terrível participação, e que possivelmente
Deverei enganar, fingir, falar com palavras alheias
Porque sei que há, longínqua, a claridade de uma aurora.”

(“Mensagem à Poesia”)

Assim, o leitor não deve levar à risca as palavras da “Advertência”, pois há poemas belíssimos em ambas as partes da obra.

Tirará maior prazer o leitor, aliás, se comparar os poemas da primeira com os da segunda parte, atividade que terá como resultado, sem dúvida, o reconhecimento de que – a despeito da revolução ideológica sofrida e assumida pelo autor – se está, inequivocamente, diante de um mesmo íntegro, fraterno, humano, apaixonado e genial Vinicius de Moraes.

FONTE: Moraes, Vinicius de. Antologia Poética. São Paulo, Ed. Cia. Das Letras, 2009.

Nova Antologia Poética, de Mário Quintana

Esta Nova Antologia Poética de Mário Quintana, comemorativa de seu centenário (1906-2006), reúne poemas representativos da obra do poeta cuja importância vai sendo crescentemente conhecida pelo público mais amplo e reconhecida pela crítica especializada.

O humor de Mário Quintana, inteligente no sentido e sutil na linguagem, é sempre a primeira mensagem a chegar ao leitor. Com palavras aparentemente despretensiosas, o poeta urde em exíguos espaços de poemas curtos verdadeiras máximas filosófico-irônicas, como neste “Poeminho do Contra”:

Todos esses que aí estãoAtravancando meu caminho,Eles passarão...Eu passarinho!”

Porém, nem só de humor é feito Quintana. Sua poesia é de grande diversidade. Se sua forma de abordar temas insalubres prefere, por vezes mas nem sempre, a tirada irônica ou mesmo sarcástica, na abordagem do sentimento de amor, por exemplo, sua abordagem é suave, avessa à pieguice e de um lirismo muito particular, senão profundamente comovente:

"Canção do amor imprevisto

Eu sou um homem fechado.
O mundo me tornou egoísta e mau.
E a minha poesia é um vício triste,
Desesperado e solitário
Que eu faço tudo por abafar.

Mas tu apareceste com a tua boca fresca de madrugada,
Com o teu passo leve,
Com esses cabelos...

E o homem taciturno ficou imóvel, sem compreender nada,
[numa alegria atônita...
A súbita, a dolorosa alegria de um espantalho inútil
Aonde viessem pousar os passarinhos!”


Os poemas de Quintana têm sempre um susto ou um estranhamento embutido. Se nos poemas curtos essa sensação atordoa o leitor de chofre, como um boneco de mola que salta da caixinha de surpresas, nos poemas mais extensos essa sensação vai sendo preparada com requintes de mágico ilusionista, de modo a que o leitor, ao atingir o ponto final do texto, veja surgir diante de si, como em passe de mágica, uma imagem inusitada.

Não por acaso, entre seus livros mais famosos estão O Aprendiz de Feiticeiro, Espelho Mágico e Baú de Espantos. Mário Quintana explora as possibilidades lúdicas e mágicas das palavras e seus efeitos encantatórios, hipnóticos e mesmo oníricos:

“Noturno

Nem tudo está
Mudando:
Durante o sono
O passado
Em cada esquina põe um daqueles antigos lampiões
E os autos, minha filha, esses ainda nem forma inventados...
Só essa velha carruagem rodando rodando.
Sobre as pedras irregulares do calçamento.”

Comparar os poemas curtos com os poemas mais extensos de Quintana presentes nesta Antologia é buscar compreender um poeta que abordou temas comuns ao homem do século XX por meio de uma linguagem incomum.

FONTE: Quintana, Mário. Nova Antologia Poética. 12 ed. São Paulo, Ed. Globo, 2007.

Antologia Poética, de Patativa do Assaré


Org. Gilmar de Carvalho

A obra de Patativa do Assaré, edição após edição, vê as barreiras do preconceito caírem e seu público aumentar por todos os cantos do país. A linguagem moldada pela sonoridade, pela visão de mundo, pelo modo de vida – e pela viola – nordestinos, seus poemas retratam a labuta, os sentimentos e a índole dos que enfrentam os infortúnios da seca e da miséria numa região em que a violência e a injustiça social andam de mãos dadas.

Seus textos ficaram conhecidos pelo público mais amplo primeiramente na voz e na sanfona de Luiz Gonzaga, o Luiz do Baião. Composições como “Triste Partida” – rodou muito tempo pelas rádios e forrós do país e hoje, em um belo vídeo de animação, circula na televisão, nos DVDs particulares e na internet:

“Nós vamo a São Paulo
que a coisa tá feia.
Por terras aleia
nós vamo vagá.
Se o nosso destino
não fô tão mesquinho
Pro mermo cantinho
Nós torna a vortá.”

Esta Antologia Poética de Patativa do Assaré, que conta com um breve mas elucidativo estudo sobre a obra do poeta, reúne poemas na seguinte organização: "Inspiração nordestina", "Novos poemas comentados", "Cante lá que eu canto cá", "Ispinho e fulô", "Balceiro", "Cordéis", "Aqui tem coisa" e "Balceiro 2".

Com isso, o organizador Gilmar de Carvalho pretendeu oferecer ao leitor uma amostra representativa da obra desse importante poeta brasileiro que, revolvendo a terra como agricultor e animando bailes ao som da viola, fez o verso sertanejo, brotado da terra e da alegria popular, ganhar reconhecimento sob a forma impressa, muitas vezes reservada apenas a formas mais eruditas, urbanas ou elitizadas.

Abrir esta Antologia, cujos poemas são irmãos do cordel e do repente, e lê-la coletivamente em voz alta devolve vida a um texto que não nasceu para ficar preso na página feito passarinho em gaiola. Fica aqui esta sugestão.

FONTE: Patativa do Assaré. Org. e Pref. Gilmar de Carvalho. 7 ed. Fortaleza, Ed. Demócrito Rocha, 2008.