segunda-feira, 12 de abril de 2010

Nova Antologia Poética, de Mário Quintana

Esta Nova Antologia Poética de Mário Quintana, comemorativa de seu centenário (1906-2006), reúne poemas representativos da obra do poeta cuja importância vai sendo crescentemente conhecida pelo público mais amplo e reconhecida pela crítica especializada.

O humor de Mário Quintana, inteligente no sentido e sutil na linguagem, é sempre a primeira mensagem a chegar ao leitor. Com palavras aparentemente despretensiosas, o poeta urde em exíguos espaços de poemas curtos verdadeiras máximas filosófico-irônicas, como neste “Poeminho do Contra”:

Todos esses que aí estãoAtravancando meu caminho,Eles passarão...Eu passarinho!”

Porém, nem só de humor é feito Quintana. Sua poesia é de grande diversidade. Se sua forma de abordar temas insalubres prefere, por vezes mas nem sempre, a tirada irônica ou mesmo sarcástica, na abordagem do sentimento de amor, por exemplo, sua abordagem é suave, avessa à pieguice e de um lirismo muito particular, senão profundamente comovente:

"Canção do amor imprevisto

Eu sou um homem fechado.
O mundo me tornou egoísta e mau.
E a minha poesia é um vício triste,
Desesperado e solitário
Que eu faço tudo por abafar.

Mas tu apareceste com a tua boca fresca de madrugada,
Com o teu passo leve,
Com esses cabelos...

E o homem taciturno ficou imóvel, sem compreender nada,
[numa alegria atônita...
A súbita, a dolorosa alegria de um espantalho inútil
Aonde viessem pousar os passarinhos!”


Os poemas de Quintana têm sempre um susto ou um estranhamento embutido. Se nos poemas curtos essa sensação atordoa o leitor de chofre, como um boneco de mola que salta da caixinha de surpresas, nos poemas mais extensos essa sensação vai sendo preparada com requintes de mágico ilusionista, de modo a que o leitor, ao atingir o ponto final do texto, veja surgir diante de si, como em passe de mágica, uma imagem inusitada.

Não por acaso, entre seus livros mais famosos estão O Aprendiz de Feiticeiro, Espelho Mágico e Baú de Espantos. Mário Quintana explora as possibilidades lúdicas e mágicas das palavras e seus efeitos encantatórios, hipnóticos e mesmo oníricos:

“Noturno

Nem tudo está
Mudando:
Durante o sono
O passado
Em cada esquina põe um daqueles antigos lampiões
E os autos, minha filha, esses ainda nem forma inventados...
Só essa velha carruagem rodando rodando.
Sobre as pedras irregulares do calçamento.”

Comparar os poemas curtos com os poemas mais extensos de Quintana presentes nesta Antologia é buscar compreender um poeta que abordou temas comuns ao homem do século XX por meio de uma linguagem incomum.

FONTE: Quintana, Mário. Nova Antologia Poética. 12 ed. São Paulo, Ed. Globo, 2007.

Antologia Poética, de Patativa do Assaré


Org. Gilmar de Carvalho

A obra de Patativa do Assaré, edição após edição, vê as barreiras do preconceito caírem e seu público aumentar por todos os cantos do país. A linguagem moldada pela sonoridade, pela visão de mundo, pelo modo de vida – e pela viola – nordestinos, seus poemas retratam a labuta, os sentimentos e a índole dos que enfrentam os infortúnios da seca e da miséria numa região em que a violência e a injustiça social andam de mãos dadas.

Seus textos ficaram conhecidos pelo público mais amplo primeiramente na voz e na sanfona de Luiz Gonzaga, o Luiz do Baião. Composições como “Triste Partida” – rodou muito tempo pelas rádios e forrós do país e hoje, em um belo vídeo de animação, circula na televisão, nos DVDs particulares e na internet:

“Nós vamo a São Paulo
que a coisa tá feia.
Por terras aleia
nós vamo vagá.
Se o nosso destino
não fô tão mesquinho
Pro mermo cantinho
Nós torna a vortá.”

Esta Antologia Poética de Patativa do Assaré, que conta com um breve mas elucidativo estudo sobre a obra do poeta, reúne poemas na seguinte organização: "Inspiração nordestina", "Novos poemas comentados", "Cante lá que eu canto cá", "Ispinho e fulô", "Balceiro", "Cordéis", "Aqui tem coisa" e "Balceiro 2".

Com isso, o organizador Gilmar de Carvalho pretendeu oferecer ao leitor uma amostra representativa da obra desse importante poeta brasileiro que, revolvendo a terra como agricultor e animando bailes ao som da viola, fez o verso sertanejo, brotado da terra e da alegria popular, ganhar reconhecimento sob a forma impressa, muitas vezes reservada apenas a formas mais eruditas, urbanas ou elitizadas.

Abrir esta Antologia, cujos poemas são irmãos do cordel e do repente, e lê-la coletivamente em voz alta devolve vida a um texto que não nasceu para ficar preso na página feito passarinho em gaiola. Fica aqui esta sugestão.

FONTE: Patativa do Assaré. Org. e Pref. Gilmar de Carvalho. 7 ed. Fortaleza, Ed. Demócrito Rocha, 2008.

Antologia Poética, de Manuel Bandeira

Antologia Poética é uma reconhecida obra de Manuel Bandeira. Organizada pelo próprio autor em 1961, reúne, a seu critério, poemas representativos dos livros: A Cinza das Horas, Carnaval, O Ritmo Dissoluto, Libertinagem, Estrela da Manhã, Lira dos Cinquent'anos, Belo Belo, Opus 10, Estrela da Tarde, Poemas Traduzidos e Mafuá do Malungo.

Poeta de cultura erudita, tradutor de inúmeras obras para o português e crítico de arte, Bandeira foi acolhendo em sua linguagem poética uma simplicidade tão meticulosamente estudada que seus poemas falam com igual impacto a públicos diversos.

Seja o leitor iniciante, seja o leitor experimentado, ambos encantam-se com seus poemas; quer o leitor ocasional, quer o leitor contumaz de suas obras, ambos se comovem com seus inesperados arranjos poéticos que, sob a aparência de brincadeira, destilam a crítica, como no poema “Os sapos”:

“Enfunando os papos,
Saem da penumbra,
Aos pulos, os sapos.
A luz os deslumbra.
Em ronco que aterra,
Berra o sapo-boi:
- “Meu pai foi à guerra!”
- “Não foi! – “Foi!” – Não foi!”
;

Seu lirismo veste-se de inocência com feitio melancólico e pleno de ambiguidades, como no outro poema “Porquinho-da-índia”:

“Quando eu tinha seis anos
Ganhei um porquinho-da-índia.
Que dor de coração me dava
Porque o bichinho só queria estar debaixo do fogão!

Levava ele pra sala
Pra os lugares mais bonitos, mais limpinhos,
Ele não gostava:
Queria era estar debaixo do fogão.
Não fazia caso nenhum das minhas ternurinhas...

- O meu porquinho-da-índia foi a minha primeira namorada.”

A linguagem direta e simples empregada pelo poeta não deve iludir o leitor quanto à natureza enigmática de seus poemas. A voz do sapo, no primeiro, é uma crítica ácida cujo endereço cabe ao leitor desvelar, tanto quanto não é, no segundo, despretensiosa a observação do verso final – ilustrativa de uma sensação de frustração que se estende no tempo.

Descobrir o que há por sob a linguagem aparentemente franca de Manuel Bandeira é um exercício prazeroso, uma vez que essa “franqueza” dá “dicas” de muitas ambiguidades que, exploradas, revelam surpreendentes sentidos subjacentes.

É lógico que esse exercício fica mais rico se o leitor mais experiente recorrer à fortuna crítica da obra do poeta, porém, não há dúvida que os dois poemas em destaque, por exemplo, poderiam ser oferecidos a uma criança que, estimulada por perguntas bem feitas, teria muito a dizer sobre esses “sapos” e sobre esse bichinho de estimação que não dá bola a quem tanto o ama...

FONTE: Bandeira, Manuel. Antologia Poética. 12 ed. Rio de Janeiro, Ed. Nova Fronteira, 2001.